sexta-feira, 8 de julho de 2016

Rotina para evitar lembranças



Vivo os piores dias tentando me blindar das lembranças. Hoje não sei mais quem sou, só sei que dia após dia luto contra as lembranças.
Um simples bom dia pode me tirar o humor, são nesses singelos gestos que as lembranças mais marcantes se escondem, prontas pra atacar.

Pavor.

Outro dia, tive que desviar da loja de perfumes. Era fato que elas estavam lá, todas com seus olhinhos brilhantes, escondidas em cheiros, sedentas pela minha paz. Mudei o caminho, não passei pela loja.
Teve também aquele almoço que recusei. Eu sei que elas estariam prontas, camufladas entre os sabores, esperando minha primeira garfada. Não... é melhor não.
Evito, dia após dia. O ferimento que uma lembrança faz é aberto e tem aquela dorzinha de tatuagem. Incomodativa, constante, com som,  e que depois inflama, causa febre, dor de cabeça. O pior é que não tem receita médica pra sarar, não tem um: “Ô seu médico, eu tô com um ferimento de lembrança”. Não existe remédio pra essa patologia, depois de feita, a ferida só é curada com o tempo, um bom tempo.




Por isso eu vivo assim, desviando de pessoas, de lojas de perfumes, de lugares e da sua boca.



domingo, 3 de julho de 2016

Repetição maldita


Mais um morreu, e não foi de amor, nem de tédio. Não foi de fome e nem de tanto dançar. Foi de cacos de vidro e de palitos de dente. Corte no pescoço, olhos perfurados, calça e cueca até os joelhos, encontrado jogado e já frio nun banheiro sujo.

Assim acordo quase todos os dias. Mais um morreu. Mais um morreu. Mais um morreu. E eu continuo aqui. Continuo ouvindo piadas, vendo olhares, assistindo absurdos.

Tem dias que preferia estar nesta lista, mas é vida que segue. Vou pegando táxi escondido, andando sempre acompanhado, suando frio quando escuto um comentário, desviando de grupos, de pessoas, evitando ruas com bares, não pegando em sua mão, não beijando e muito menos abraçando.














Será se assim eu vivo ou cometo pequenos suicídios diários?